Festival do Rio: ”As Viúvas”

Na cultura geral, as viúvas são figuras cobertas de tradição. Mulheres do lar, que foram fielmente dedicadas aos maridos e se vêem sozinhas após suas mortes. Algumas abraçam o papel por tanto tempo que chegam a perder parte da própria identidade. Outras são obrigadas a viver nesse papel por imposição. Porém, nenhuma delas está no filme de Steve McQueen que abriu o 20º Festival do Rio.

Com um roteiro escrito por Gillian Flynn (a mesma de Garota Exemplar) e McQueen, o longa percorre um caminho diferente ao usar um roubo como pano de fundo para apresentar os personagens e suas histórias. Ao invés de muita ação, carros e tiros, temos uma trama mais introspectiva, que prende a atenção do espectador. Cena por cena vamos conhecendo melhor esses personagens e suas motivações.

Encabeçado por Viola Davis, sem dúvida um dos grandes atrativos de As Viúvas é o elenco. Viola interpreta Veronica Rawlings, a viúva do líder da quadrilha que roubou o deputado Manning (Brian Tyree Henry) e foi emboscada pela polícia. Ela passa da mulher que tinha tudo a que não tem mais nada. Sem marido e família, o que move Veronica é a necessidade de manter tudo como está. E é por isso que decidi ir atrás das outras viúvas para que juntas realizem um último roubo planejado por seu marido.

Todavia, as outras viúvas não levavam a mesma vida mansa que Veronica. Linda tem dois filhos e muitas dívidas graças ao marido. Depois que ele morre, ela perde a loja de roupas, único sustento garantido dela e dos filhos. Já Alice é a típica esposa troféu. Fica em casa a espera do retorno do marido, mantendo a casa arrumada, comida pronta e um humor e aparência impecáveis, mesmo quando apanha dele. Juntas vão mostrar que são mais do que aparentam e aquela que tem a melhor evolução nesse ponto é Alice.

Vista como uma mulher fútil e sem propósito, ela faz de tudo para quebrar esse estereótipo e mostrar sua força e inteligência perante as outras. Nesse ponto Elizabeth Debicki ganha mais destaque do que Michelle Rodriguez que apresenta uma atuação mais comedida do que suas colegas. A maioria das suas cenas são mornas e gera inclusive uma quebra no ritmo do filme. O que melhora quando Debicki e Viola contracenam, pois as duas criam um contraponto interessante de duas mulheres cujos maridos se conheciam e tinham algo em comum, enquanto elas se esforçam para tentar entender uma a outra.

Do lado de fora está a corrida eleitoral para deputado do distrito 18. Nela estão Jack Mulligan (Colin Farrell) cujo pai e família sempre estiveram na política e a frente do distrito, e Jamal Manning que quer deixar a vida de bandido para se eleger e poder ganhar dinheiro de outra forma. Os dois vão disputar dentro e fora das urnas por essa vaga e isso acaba refletindo também nas ações das viúvas.
Aqui McQueen tenta mostrar um pouco como funciona a política que os eleitores desconhecem. São negociatas, promessas, subornos e muito dinheiro por debaixo dos panos.

Por fim, As Viúvas é um filme que vai hipnotizar o espectador, pois seus personagens tem tempo suficiente para serem explorados, com começo, meio e fim, além de possuir algumas cenas de plano sequência que vão contribuir para aumentar o interesse e a tensão do longa. E para fechar trilha sonora produzida por Hans Zimmer.*

 

*Texto escrito pela jornalista e crítica de cinema Melissa Andrade.